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Mas afinal, a sardinha está em extinção ou não?

"Pesca da sardinha deve ser totalmente suspensa", foi um título que andou na ribalta, quando o organismo científico de aconselhamento da Comissão Europeia fez uma recomendação inédita: "Portugal deve parar por completo a pesca de sardinha e durante um período mínimo de 15 anos para que o stock de sardinha regresse a níveis aceitáveis." Esta notícia chocou todos, especialmente os pescadores que iriam ver a sua fonte de rendimento a acabar. Como iria ser daqui para a frente? Parados em casa? Como iriam suportar as contas da sua família?

Mas será que a sardinha está realmente em extinção? Estive à conversa com um pescador da Figueira da Foz que me disse que "existe muita sardinha no mar, isto é mais uma questão política",que "estamos a perder venda no mercado mundial", "estão a fazer trocas mundiais, e quem sofre com isto é a pesca e os pescadores".  VEJA MAIS AQUI

No dia 24 de julho de 2016, a página da revista Visão, publicou um texto baseado numa embarcação da Figueira da Foz que foi em pesca da sardinha, a publicação teve o título "A sardinha é o petróleo das águas portuguesas". Mas o que quer isto dizer? 

"Arriscam todas as noites em alto-mar sem saberem o que lhes reserva a faina. Num dia de sorte e muito trabalho, os pescadores podem levar um balde de sardinhas para casa e uma pequena percentagem do valor a que o pescado for vendido na lota. Se correr mal, vão a abanar um balde vazio, tal como os bolsos, e regressam no dia seguinte – pode ser que a sorte mude.

Querem ir descansar um bocado? É melhor aproveitarem agora, porque é o que vamos fazer todos.” Para quem, como nós, tinha acabado de entrar na Gaivota do Mondego, naquela noite já alta de um domingo de junho, a sugestão de Mário Santos parecia estranha. Mas uma coisa que se aprende rapidamente é que os conselhos de quem anda na pesca há muitos anos são ordens. Sobretudo quando se está prestes a navegar para alto-mar. Obedecemos, claro. Aos 31 anos, o pescador Mário, natural da Praia da Leirosa, tal como 16 dos 18 homens da companha da Gaivota do Mondego, já conta com um terço da vida passado só a bordo desta traineira e sabe bem do que fala.

Afinal de contas, também não havia muito a fazer por agora no convés. O mestre há muito que aproveitava para descansar nos minúsculos aposentos da popa e os homens, à medida que foram chegando à embarcação, cada qual com um pequeno balde branco vazio e um saco com o farnel, desceram também às camaratas, na proa, para umas horas de sono.

Apesar da nortada, que não se sentia tanto no porto de pesca da Figueira da Foz como ao largo, estava-se bem no convés, a apreciar os preparativos das tripulações de cada uma das oito embarcações que se aprestavam também para zarpar. “As noites de Lua cheia são boas para a sardinha”, soltou Diogo Borracho. Aos 26 anos, é o mais novo da Gaivota do Mondego.

Coube-lhe em sorte o primeiro quarto de vigia e dar sinal ao mestre do momento em que a primeira das outras embarcações larga amarras. “A nortada também é boa porque afasta as águas mais quentes da superfície e traz à tona águas mais frias, com os nutrientes de que os cardumes precisam para se alimentarem. E é bom que as sardinhas se alimentem, porque têm andado sequinhas”, remata de pronto, com um sorriso e muita sabedoria, antes de, também ele, se retirar.

Nas camaratas da proa, iluminadas por uma luz ténue, os homens descansam e não há barulho, exceto o que vem do ressonar de alguns. Está calor, e a única cama que resta, uma das mais próximas da proa, é demasiado pequena para esticar as pernas. Mas vai ter de servir para passar pelas brasas e ajudar a acelerar o efeito do comprimido para o enjoo.

Só por volta das duas da madrugada é que os motores começam a trabalhar e a traineira se faz à vida.

Na embarcação ninguém se mexe. Continuam todos tal como estavam, mais do que habituados àquela ligeira ondulação do rio e mesmo à entrada nas águas salgadas. O mar não está chão, mas nem por isso se mostra particularmente agitado.

As ondas não têm mais de metro e meio. Nada de especial.

 

‘UMA VIDA LINDA’

Ainda não tinha passado uma hora desde que saíramos do porto, a pouco menos de três milhas marítimas da costa, quando a sirene tocou a avisar os homens que o sonar detetara um cardume. “Com sorte é sardinha”, ansiou João Neto, 41 anos, natural de Buarcos, há um quarto de século “na vida do mar”. Na ponte, o homem do leme também desconfia que seja. “Ainda que o sonar não nos permita identificar com exatidão a espécie encontrada”, explica. Hélio Paulino é o mestre. Ainda só tem 40 anos mas já anda “nisto” há mais de 20.

“O meu pai era mestre e eu fui pescador, contramestre e agora sou mestre há dez anos”, explica. Tem vários cursos de pesca de alto-mar e espera atingir ainda este ano o topo de carreira, com o curso de mestre do largo pescador.

Os primeiros homens a entrar ao serviço são os da chalandra, o pequeno bote de madeira que é retirado pela popa para as águas com a ajuda de um cabo. Ricardo Borges, 40 anos, é um dos que mais arriscam – quando o mar está bravo, o pequeno bote transforma-se numa minúscula casca de noz naquele oceano imenso. Mas Ricardo não se imagina a fazer outra coisa. “Isto é bonito, é uma vida linda, mas o mal que tem a vida na traineira é não ter ordenado”, dirá mais tarde, que isto agora não está para grandes conversas.

A pesca da sardinha é feita em cerco com uma rede de quase um quilómetro de extensão.

Uma das extremidades fica na chalandra enquanto a traineira contorna o cardume e vai fechar esse círculo.

“Agora é rezar para que seja mesmo sardinha e para que a rede não se rasgue”, diz o mestre apontando para um dos monitores que compõem o painel de instrumentos na ponte da traineira, e onde é visível uma mancha escura.

É mesmo sardinha e, se tudo correr bem, com apenas um lanço a Gaivota do Mondego atinge o limite permitido por cada faina, que é de 166 cabazes – 3652 quilos (cada cabaz equivale a cerca de 22 quilos).

“Antigamente pescava-se mais quantidade. Com as quotas impostas pela UE, os preços subiram 4 a 5 vezes, mas preservaram-se mais as espécies. Eu sou favorável às quotas. O que não acho bem é que só nos deixem trabalhar sete meses por ano. Pelo menos nove meses devíamos poder fazê-lo”, justifica o mestre Hélio.

SARDINHA, O PETRÓLEO DO MAR?

Este ano, a quota portuguesa vai chegar às 19 mil toneladas. Mas alguns armadores pedem mais regulamentação

António Lé é uma das vozes que mais se têm batido pela regulamentação do setor da pesca.

Com uma frota de seis embarcações, entre elas a Gaivota do Mondego, o armador é favorável também às quotas para proteção dos reprodutores e da época da desova.

Para o empresário, “a sardinha é o petróleo das águas portuguesas e faz parte da identidade de um povo”, pelo que entende ser fundamental a regulação do setor. “Não queremos viver de subsídios. As pessoas querem viver do seu trabalho. Agora, o que pretendemos é condições de trabalho”, diz.
Muito crítico em relação ao anterior Governo, nomeadamente para com Assunção Cristas, que detinha a pasta do setor, o armador diz que a atual líder centrista “é uma pessoa extremamente educada, mas com um desconhecimento profundo do que é a pesca em Portugal”. António Lé vai mesmo mais longe, não tendo dúvidas de que, com as políticas implementadas pelo anterior Governo, a pesca tinha os dias contados: “Toda a gente defende a economia azul, a economia do mar, menos a ex-ministra que defendia o museu da economia do mar.”
Ainda sem uma opinião formada sobre o papel do atual Governo, o armador diz que já fez, pelo menos, alguns reajustes.

A quota de 14 mil toneladas a que o País tem direito por deliberação comunitária vai chegar às 19 mil toneladas, com a caução do executivo. Mas há muito por fazer pela certificação da pesca e pela garantia de longevidade desta atividade."

Fonte: Visão

Inês Silva
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